DiQuinta do PETHL: Cinco poemas sobre a ancestralidade africana e afro-diaspórica

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Olá! O DiQuinta desta semana foi desenvolvido pelo bolsista Rodrigo Peixoto e apresentará 5 poemas que resgatam a ancestralidade africana e afro-diaspórica.

O resgate constante da ancestralidade africana e afro-diaspórica, de uma maneira geral, enquanto um legado de ricos saberes e imensurável diversidade, mas também enquanto denúncia do racismo enraizado, surge como recurso de extrema importância para a formação da identidade negra, uma vez que o seu apagamento histórico, a partir do colonialismo, ocorre de forma sistêmica.

Nesse sentido, a arte aparece como importante forma da expressão dos mais variados sentimentos e, portanto, da (re) apropriação destes conhecimentos marginalizados e invisibilizados pelas fontes “oficiais” da produção do saber. Pensando nisso, separamos cinco poemas que ilustram a relevância dessa ancestralidade.

Pés brancos sobre estrelas, do poeta brasileiro Carlos de Assumpção

Vocês se apoderam das terras

Dos rios e dos mares

Dos campos e das cidades

Dos costumes e das leis

Da vida e da morte

Do céu e do inferno

De Deus e do Diabo

Vocês se julgam senhores exclusivos de tudo

Vocês estão esquecidos

De que tudo aqui foi construído por mim

E ninguém mais

Vocês não percebem

Que pisam o sangue sangrado de meus ancestrais.

Aforismo, da poeta moçambicana Noémia de Sousa

Havia uma formiga

compartilhando comigo o isolamento

e comendo juntos.

Estávamos iguais

com duas diferenças:

Não era interrogada

e por descuido podiam pisá-la.

Mas aos dois intencionalmente

podiam pôr-nos de rastos

mas não podiam

ajoelhar-nos.

Dias de Kizomba, da poeta brasileira Conceição Evaristo para Abdias do Nascimento

Ab(dias) de lutas e não dias de luto.

Um homem como Abdias, estrela incandescente,

não morre.

A sua luz, cor negra zagaia

feriu a branca inconsciência

de uma democracia racial nula e vil.

Um homem como Abdias, estrela Nascimento,

Zumbi eternizado, não morre.

A sua luta ziguezagueia d’África à diáspora

espalhando sementes baobás

em cada uma/um de nós.

Deixo-te a maior missão: a reconstrução de África, da poeta moçambicana Paulina Chiziane.

Aqui houve grandeza

Destruída pela bárbara invasão

Aqui reside o útero da vida

E o umbigo do mundo

Aqui é o berço da História

Do Cabo ao Cairo

O vento geme como quem ri e chora.

Ainda assim eu me levanto, da poeta estadunidense Maya Angelou

Você pode me riscar da História

Com mentiras lançadas ao ar.

Pode me jogar contra o chão de terra,

Mas ainda assim, como a poeira, eu vou me levantar.

Como a lua e como o sol no céu,

Com a certeza da onda no mar,

Como a esperança emergindo na desgraça,

Assim eu vou me levantar.

Deixando para trás noites de terror e atrocidade

Eu me levanto

Em direção a um novo dia de intensa claridade

Eu me levanto

Trazendo comigo o dom de meus antepassados,

Eu carrego o sonho e a esperança do homem escravizado.

E assim, eu me levanto, eu me levanto, eu me levanto.

Referências:

Livro Não Pararei de Gritar, de Carlos de Assumpção (Editora Companhia das Letras).

Livro Sangue Negro, de Noémia de Sousa (Editora Kapulana).

Livro Poemas da Recordação e Outros Movimentos, de Conceição Evaristo (Editora Malê).

Livro O Canto dos Escravizados, de Paulina Chiziane (Editora Nandyala).

Livro Poesia Completa, de Maya Angelou (Editora Astral Cultural).